Dia desses conversando com um amigo disse-lhe que baseando-me na minha experiência como professor da rede pública e privada de ensino, que a educação no Brasil é no todo muito ruim, não sendo assim não amargariamos as últimas colocações no PISA (Programa internacional de avaliação de alunos). Ele, no entanto, como pai zeloso que é, orgulhava-se pelo filho estudar em uma escola particular, entendendo que assim ele teria uma boa educação. Descordei dele, o que de pronto gerou um acalourado debate, que se mostrou tanto esclarecedor a mim, quanto a ele. Coloco aqui alguns argumentos dele, e meus é claro, afim de socializar algumas idéias que podem sem duvida gerar profundas reflexões sobre o quanto nos enganamos a respeito de nosso sistema educacional.
Meu caro amigo começou dizendo que na escola particular do filho dele havia um número limitado de alunos por sala, que as salas eram climatizadas, que havia professores usando recursos tecnológicos de última geração, havia laboratório de ciências para a realização de experimentos, e que principalmente não havia casos de violência escolar.
Logo percebi que meu amigo não havia entendido o que eu havia dito. E assim, senti-me na obrigação de me fazer entender:
Em primeiro lugar, é fato que os alunos da rede privada estão mais seguros que os da rede pública, a violência escolar existe e é um ponto em que muito tem de se melhorar nas escolas municipais, estaduais e federais. Contudo, no que diz respeito ao número de alunos, pode-se verificar uma igualdade de condição, tendendo para uma vantagem das escolas públicas onde o número de alunos varia apreciavelmente no decorrer do ano letivo por conta da evasão escolar.
Em segundo lugar, concordo no que diz respeito a estrutura. Realmente as escolas privadas são bem melhor servidas de instalações, equipamentos e número de funcionários. No entanto, educar não passa somente por isso, entendo até que passa bem menos por isso. Na Finlandia, que tem de acordo com o PISA a melhor educação do mundo, as salas de aula são extremamente tradicionais, utilizando inclusive o velho quadro de giz, não tendo nada haver com um cenário "Hi-tech" imaginado por muitos.
É claro que boas intalações e recursos didáticos favorecem o ensino, e são necessários como suporte no ensino. No entanto, não é a existência deles que assegura o sucesso do processo ensino-aprendizagem. Um bom exemplo disto são os laboratórios de ciências das escolas brasileiras que, por mais bem equipados que sejam, ainda hoje abrigam práticas experimentais orientadas por roteiros fechados em que o aluno tem como finalidade apenas a comprovação daquilo que antes lhe foi apresentado. Pesquisas realizadas desde o início da década de 90 mostram que práticas experimentais como estas, pouco acrescentam aos alunos. Melhor seria uma proposta contrutivista, em que o conteúdo viesse a reboque da experimentação, não se prestando assim como uma simples confirmação daquilo que outrora foi visto.
Meu amigo estava a esta altura meio incrédulo sobre aquilo que eu dizia, argumentou que o sucesso nas provas de vestibular e inclusive no PISA vinha mais dos alunos da rede privada que da pública, e que por isso as escolas particulares eram melhores.
Mais umas vez percebi que ele não entendera onde eu queria chegar, pois é indubitável que o rendimento das escolas privadas nos processos seletivos é superior ao das escolas públicas. Mas, minha pergunta pra ele foi "E o que isto tem haver com educação?". Absolutamente nada! Estes mesmo alunos que representam os 25% mais ricos de nosso país tem um desempenho inferior que os 25% mais pobres dos países que ocupam as primeiras colocações no PISA. Ou seja, nossos melhores e mais ricos alunos, não alcançam o desemapenho dos mais pobres dos países desenvolvidos participantes desta avaliação. Não é a toa que que a reforma da educação entrou na agenda de discussão governamental, ela é uma necessidade para o desenvolvimento do país e não só mais um índice a ser mostrada a UNESCO.
Meu amigo a partir disto pareceu entender do que eu falava, estava estupefado. Só conseguiu dizer "Caramba! Eu não sabia disso", senti que este esclarecimento deixou-lhe aflito, imagino que por conta do futuro do filho. Na mesma medida, ficou claro para mim que de maneira geral atribui-se as escolas particulares uma qualidade superior tomando-se como referência as escolas públicas, ou seja, sendo uma escola particular melhor que uma pública, sua educação´é de qualidade. Isto é uma falácia, e o que o PISA e o ENEM nos mostram é que temos um ensino privado menos pior que o público, mas ainda muito aquém do que precisamos para chegarmos ao patamar dos países desenvolvidos.
A culpa deste cenário tenebroso de nossa educação não pode ser atribuída somente a um fator: professores, alunos, proprietários de escolas particulares, pedagogos, vestibular, ou a formação docente. A culpa está no que é o conjunto de tudo isto: o nosso sistema educacional, que precisa ser profundamente repensado sob todos os aspectos.
Por George Castro
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